sábado, 3 de janeiro de 2015

Os sintomas de Myle #2

                Todo dia às sete horas da manhã eu acordo, me arrasto até a cozinha, tomo um leite e mastigo qualquer pão ou bolo que eu achar, as vezes como frutas com cereal e leite, eu amo cereais.Visto-me sempre com meu vestido azul e coloco o avental da cafeteria, sinto que terei que comprar um novo vestido porque o meu está tão desbotado que está dando pra ver além das costuras.
               Saio de casa vagarosamente, passo pela casa do vizinho e provoco o filho dele, um garotinho insuportável que costuma me fuzilar com os olhos e me aponta uma espadinha de camelódromo e faz sons de luta com a boca, então sempre passo por ele finjo que tenho uma bazuca e atiro nele, faço algumas provocações e saio correndo, é sempre muito engraçado.

              A cafeteria fica cinco quadras da minha casa, no caminho sempre vejo o carinha da videolocadora que é absolutamente lindo, vejo a senhora Sara sentando na varanda para tomar uma xícara de chá, e  a moça que trabalha para o correio que é muito magra e estranhamente bonita.

             Essa semana está sendo bem diferente, pouco movimento na cafeteria, minhas notas na faculdade estão todas aprovadas, com toda a certeza, os ares de Retiro dos ventos estão tão agitados quanto a praia que nos rodeia, é inicio de outono, ventos fortes é a característica mais marcante aqui.Chegando na cafeteria a rotina começa: balanço o tapete da porta e abro a "pãozinho", acendo as luzes revelo aquela linda paisagem um tanto vintage, organizo as mesas, ligo as máquinas e abro as janelas, acabei me esquecendo de contar que em cada janela tem um sino dos ventos, que balança freneticamente com qualquer sopro de vento.

             Tenho dois amigos e uma amiga, Tomas e Bruno são gêmeos e sinceramente muito bonitos, a Bia é muito legal e bastante quieta, mas quando passa uma menina bonita na rua ela não sabe disfarçar a atração, às vezes peço para ela não ficar encarando as clientes do café, mas ela ainda não sabe lidar com os sentimentos, muito engraçado alias,Tomas tem uma namorada, a Estela, e o Bruno é apaixonado pela moça do pet shop, a Julia, ele até comprou um Labrador para poder ver ela toda semana, um verdadeiro bobo.Assim como hoje, eles sempre me visitam na cafeteria, geralmente eu estudo com o Bruno ou ficamos comparando os clientes com personagens de desenho animado:

              -Nossa olha só aquele menino, ele parece o Zeca Urubu do Pica-Pau, lembra Bia? HAHAHA - o Tomas era o melhor em comparações - Olha isso!

              -Tenho que admitir,  Ha Ha Ha! - a Bia estava fazendo fiasco com a risada engasgada dela.

             - Gente escutem aqui - Falei baixo, pois estava entrando na cafeteria a Rose - Esses dias essa moça esteve aqui, o nome dela é Rose...

             - Será que ela tem namorada? - disse Bia.

            -Ai Bianca, por favor contenha-se, ela esteve aqui com um tal de Frederico, tomaram café, e ela chorou, não entendi nada, mas tenho vontade de conhecê-la.

           -Eu também! - disse Bianca admirando Rose.

           "Plin"

           Era Rose chamando, segurei meu bloco de anotações com o coração na mão, e fui até ela:

           - Bom dia, bem-vinda a Pão-de-céu, posso servi-la?

           -Olá, Fred veio aqui hoje? - pela primeira vez ela parecia mais doce ao falar.

           -Não, a ultima vez que vi Frederico ele estava com você, e você bem... estava...

           -Sim, sei, você teria um tempo para que eu lhe pedisse algumas coisas? - senti uma pitada de mistério.

          - Ah sim,pode falar - sentei na banqueta, como quem espera um conto de fadas.

         Olhei para o balcão, Bruno e Tomas não estavam fazendo nada além de atacar o pote de M&M's , e Bia, bem, ela estava tentando achar sua princesa encantada.

          -Como você disse que era seu nome mesmo? - disse Rose

          -Ah, eu não disse - fui ríspida - Me desculpe, é Emile.

         - Bom, meu nome é Rose como já sabe, eu fiquei sabendo que Fred gostou muito dessa cafeteria e que ele vem aqui hoje, pois é aniversário dele. É o seguinte, se você puder me fazer esse favor, eu agradeceria, este aqui é um bilhete da noiva de Fred, minha irmã, eu não conseguiria entregar à ele, então se puder entregar por mim?

         Por alguns minutos me flagrei lendo os papeis, eram dois exames médicos, e uma carta escrita a mão, quando me dei por consciente respondi.

        - Sim, era só isso, eu posso fazer sim.

        -Por favor - ela parecia sincera - aconteça o que acontecer apenas diga para ele, que ela estará esperando ele na casa da nossa mãe.Obrigada Emile.

       -Pode me chamar de Myle, até mais.

       - Até mais... Myle - senti nada menos que um estado febril dentro de mim, e uma vontade insana de ler aqueles exames, mas eu não poderia, apenas coloquei na gaveta do dinheiro e continuei na minha rotina febril.


     

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